O
pai que entrega ou, por omissão, permite que o filho menor de idade
dirija seu carro não pode ser automaticamente condenado por homicídio
culposo. Para a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não
se pode presumir a culpa nem implicar penalmente o pai pela conduta do
filho, em razão de responsabilidade reflexa.
O
menor dirigia bêbado quando causou acidente de trânsito que resultou em
uma morte. A primeira instância absolveu o pai por falta de provas, mas o
tribunal local o condenou como coautor de homicídio culposo no
trânsito. Ele também foi condenado pelo crime de entrega de veículo a
pessoa não habilitada.
Coautoria e participação
O
ministro Marco Aurélio Bellizze esclareceu que o Brasil adota a teoria
monista no concurso de agentes. Isto é: em regra, todos os agentes que
executam condutas que levam ao resultado típico são condenados pelo
mesmo crime.
Porém, essa teoria só vale para crimes
intencionais. Nos crimes culposos, não se admite a condenação por
participação. Partícipe é aquele agente que, sem praticar o fato típico,
auxilia, instiga ou induz o autor a cometer o crime. De modo diverso, o
coautor também executa o fato típico e pode ser condenado em crime
culposo.
O relator ressaltou que o concurso de
agentes exige dos envolvidos uma unidade de objetivos ou intenções. Nos
crimes culposos, isso é avaliado em relação à conduta pretendida - em
geral, lícita - e não ao resultado previsível - lesivo ao direito.
Culpa presumida
"A
culpa não se presume", alertou o ministro. "Deve ser demonstrada e
provada pelo órgão acusador. Da leitura das decisões proferidas pelas
instâncias ordinárias, verifica-se, num primeiro momento, que não há
qualquer elemento nos autos que demonstre que o pai efetivamente
autorizou o filho a pegar as chaves do carro na data dos fatos, ou seja,
tem-se apenas ilações e presunções, destituídas de lastro fático e
probatório", completou.
"Ademais, o crime culposo,
ainda que praticado em coautoria, exige dos agentes a previsibilidade do
resultado. Portanto, não sendo possível, de plano, atestar a conduta do
pai de autorizar a saída do filho com o carro, muito menos se pode a
ele atribuir a previsibilidade do acidente de trânsito causado",
acrescentou Bellizze.
Negligência e imprudência
Conforme
o relator, a culpa do pai e a do filho se referem a crimes distintos.
"O pai foi negligente na guarda das chaves do veículo e o filho foi
imprudente ao dirigir automóvel sem habilitação após ingerir bebida
alcoólica", avaliou o relator.
"Não é possível, a
não ser de forma reflexa, atribuir-se ao pai a imprudência imprimida
pelo menor na direção do veículo, pois nem ao menos é possível
concluir-se que a conduta do filho tenha entrado na sua esfera de
conhecimento", concluiu.
Pela decisão, foi
restabelecida a absolvição quanto à coautoria de homicídio culposo no
trânsito, mas mantida a condenação pela entrega de veículo a menor.
HC 235827
Fonte: Superior Tribunal de Justiça
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