segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Especialistas em saúde debatem hoje a legalização da maconha

A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) retoma hoje o debate sobre a regulamentação do uso recreativo, medicinal ou industrial da maconha. A audiência pública será interativa. Para participar da transmissão ao vivo, enviando comentários, o cidadão pode acessar o Portal e-Cidadania ou ligar para o Alô Senado, no número 0800 612211.
Devem participar do debate Renato Malcher Lopes, neurocientista e professor-adjunto do Departamento de Ciências Fisiológicas da Universidade de Brasília (UnB); Vladimir de Andrade Stempliuk, membro da Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia; a assessora do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC) Nara Santos; a diretora do Centro Brasileiro de Estudos da Saúde Grazielle Custódio; e o coordenador nacional de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Roberto Tykanori.
O tema entrou na pauta de discussões no Senado devido a uma sugestão popular enviada pelo e-Cidadania (SUG 8/2014). Pela sugestão, seria considerado legal “o cultivo caseiro, o registro de clubes de cultivadores, o licenciamento de estabelecimentos de cultivo e de venda de maconha no atacado e no varejo e a regularização do uso medicinal”. A CDH aguarda relatório de Cristovam Buarque (PDT-DF) para decidir se a sugestão vai virar projeto de lei.
Antes de opinar, Cristovam pediu uma série de debates. No primeiro, em junho, o secretário-geral da Junta Nacional de Drogas do Uruguai, Julio Calzada, destacou o efeito positivo da legalização do comércio da droga sobre a criminalidade naquele país. Ele ressaltou que o Uruguai registra evolução do consumo e de seus efeitos colaterais semelhante ao de países que mantêm a criminalização.
No segundo debate, o coronel Jorge da Silva, ex-chefe do Estado Maior da Polícia Militar do Rio de Janeiro, disse que os índices de violência demonstram que o atual modelo proibicionista não deu resultados positivos. Nos dois debates, houve várias manifestações da audiência contrárias à regulamentação.
Jornal do Senado

domingo, 24 de agosto de 2014

Americanos pedem ao governo para criar lei que obrigue policiais a usar câmeras

Em apenas uma semana, uma petição popular enviada ao governo americano pela aprovação de uma lei que obrigue todos os policiais do país a usar câmeras atadas em suas fardas, com o fim de conter a brutalidade policial, recebeu quase 138 mil assinaturas até a tarde desta quinta-feira (21/8). São necessárias 100 mil assinaturas no site governamental “We the People” para obrigar a Casa Branca a dar uma resposta oficial. Qualquer pessoa pode assinar a petição eletronicamente.
A petição propõe a criação da “Lei Mike Brown”. Em 9 de agosto, o policial Darren Wilson, branco, deu seis tiros em Mike Brown, um jovem negro de 18 anos, que estava desarmado e com os braços levantados. O fato aconteceu no meio da rua. Parte dos acontecimentos foi filmada e fotografada. Mas havia diversas testemunhas no local. O episódio resultou em protestos, algumas vezes violentos, da população negra de Fergurson, no Missouri, com participação de parte da população branca.
A petição, publicada no site da Casa Branca e em diversos jornais, diz:
“Criar um projeto de lei, sancionar a lei e destinar fundos para exigir que a polícia em todos os estados, condados e cidades usem uma câmera. Essa lei deve ser aprovada em um esforço para não apenas conter a má conduta da polícia (isto é, brutalidade, discriminação racial e abuso de poder), mas também assegura que todos os policiais sigam o procedimento e removam todas as dúvidas, de abordagens policiais normalmente questionáveis. E, da mesma forma, ajudar a responsabilizar todas as partes por suas ações, dentro de uma investigação policial”.
Experiência em uma cidade da Califórnia, em que o uso de câmeras atadas na farda se tornou obrigatória, resultou em uma queda dos casos de violência policial e abuso de poder em 65%. Ao mesmo tempo, o procedimento favoreceu a polícia: muitas acusações formalizadas contra policiais foram rejeitadas quando se examinou os vídeos tomados pelos próprios policiais.
De uma maneira geral, a população americana reclama que câmeras instaladas nas cidades pelos órgãos de segurança, além das câmeras de segurança de entidades privadas, vigiam os cidadãos em tempo integral. No entanto, não há câmeras vigiando os policiais quando eles reagem de forma violenta em qualquer confronto comum com os cidadãos, ou quando abusam de seu poder.
A comunidade jurídica americana reclama da militarização da polícia. A jornalista Nadia Prupis, da publicação Common Dreams, diz que a militarização silenciosa dos departamentos de polícia dos EUA começou com a aprovação da Lei de Autorização da Defesa Nacional, que permitiu que a Secretaria de Defesa transfira aos órgãos de segurança federais e estaduais armamentos e munições. Com o tempo, isso encorajou os policiais a verem as pessoas como inimigas — e vice-versa.
O escritor Robert Koehler escreveu em seu blog, no Huffington Post, que os tempos de uma sociedade saudável, em que a polícia existia para servir as comunidades e proteger os cidadãos se foram. Agora, a polícia altamente militarizada parece uma entidade separada, controlando a sociedade a partir de ordens externas, como um exército de ocupação. “Um inimigo, em particular, é o cidadão de cor”, disse ao jornal o professor da Universidade de Kentucky, Victor Kappeler.
Na última terça-feira (19/8), em St. Louis, a poucos quilômetros de Fergurson, um rapaz negro desafiou dois policiais a matá-lo. Foi exatamente o que os policiais fizeram, na frente de várias testemunhas: dispararam vários tiros no rapaz, que morreu instantaneamente. Segundo os policiais, ele portava uma faca. Todo o incidente, desde antes de os policiais chegarem, foi filmado por um homem que estava nas proximidades, com seu telefone celular. É mais um incidente para se somar a um conflito racial que volta a se exacerbar nos EUA.
Clique aqui e aqui para ver os vídeos. 
fonte: http://www.conjur.com.br/2014-ago-21/americanos-pedem-governo-lei-obrigue-policiais-usar-cameras

NOTA DA REDAÇÃO:  QUE NÃO DEMORE ESSA MEDIDA A CHEGAR EM TERRA BRASILIS.

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

São inaceitáveis as ações de violência da polícia contra a advocacia

Agosto é mês de festa e júbilo por tudo o que o advogado representa para o avanço institucional do país e dos direitos da cidadania. A Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo (Caasp) programou extensa agenda de eventos culturais, de lazer e de promoção da saúde para marcar datas inesquecíveis à classe, que ocorreram nesse período do ano em nossa história.
Mas este também é um momento de resgatarmos todo esforço que já empreendemos em favor das prerrogativas de nossos profissionais, até para que se reafirme a força, importância e a função social da advocacia. Continuamos assistindo a atos arbitrários e violentos contra o múnusadvocatício, como aqueles que atingiram Daniel Luiz Passos Biral e Silvia Daskal Hirschbrush, do grupo Advogados Ativistas, quando acompanhavam manifestação pública em princípios de julho no centro de São Paulo; ou ainda Benedito Roberto Barbosa, quando exercia seu trabalho numa ação de reintegração de posse, em 25 de junho, também na Capital.
As ameaças ao trabalho dos advogados são uma constante, atravessam o tempo, visto que a plena vigência do Direito impede a perpetuação de privilégios e desmandos típicos de setores atrasados, mas ainda fortemente encastelados na vida institucional brasileira, especialmente na estrutura jurídica e das forças de segurança. O Brasil dava seus primeiros passos como Nação independente quando foram criadas as duas primeiras Faculdades de Direito em solo nacional, em 11 de agosto de 1827, as de São Paulo e de Olinda. Foi também em um mês de agosto que o jurista Goffredo da Silva Telles Júnior protagonizou um dos atos mais corajosos da História republicana, ao ler a “Carta aos Brasileiros”, num dia 8, no ano de 1977. O ato público foi realizado em frente à Faculdade do Largo de São Francisco, em um dos momentos mais duros e fechados da ditadura militar imposta em 1964.
O longo caminho percorrido pelo país e a própria advocacia em defesa de amplas liberdades civis e políticas, e da isonomia dos cidadãos brasileiros frente ao Direito, contribuíram para que chegássemos a uma República estável e democrática. No entanto, persistem focos de tensão entre a institucionalização das condições essenciais à vigência desse Estado Democrático, e inúmeros vícios herdados de uma cultura patrimonialista e fisiológica. Estes resistem em algumas estruturas, as quais carecem de modernização e avançam sem constrangimentos contra um dos pilares da normalização institucional, justamente as prerrogativas dos advogados.
O Estatuto da Advocacia (Lei Federal Lei 8.906/94), que agora completa duas décadas, concede ao profissional a blindagem necessária contra as tentativas de retrocesso, assegurando-lhe condições de atuar em prol do sagrado direito de defesa dos cidadãos. Para isso, o profissional tem garantida a liberdade de fazer seu trabalho, respeitado o sigilo de suas ações e a inviolabilidade dos escritórios, bem como o direito de se comunicar livremente com os clientes, ingressar em qualquer recinto da Justiça, dirigir-se aos magistrados e demais autoridades, entre muitas outras atribuições. Os acontecimentos recentes atentam claramente contra toda essa garantia legal. Ressalta-se que há muito vencemos os regimes de exceção que permitiam às autoridades colocarem-se acima da Lei.
Os direitos consagrados na Constituição do país e, posteriormente, no Estatuto, tornam ilegítimas e inaceitáveis as ações de violência e arbitrariedade protagonizadas por membros da Polícia de São Paulo contra a advocacia. Conforme bem apontou a ‘Nota Pública’ de repúdio divulgada pela OAB-SP, esses acontecimentos são típicos “de um Estado policial, que confronta o Estado Democrático de Direito, ameaça a cidadania e impede o trabalho dos advogados”. Nossas prerrogativas estão a serviço da Lei e sua violação compromete enormemente a valiosa e custosa Democracia brasileira.

fonte:  http://www.conjur.com.br/2014-ago-19/fabio-canton-sao-inaceitaveis-acoes-policia-advocacia

Ausência de acusado em interrogatório judicial não legitima prisão cautelar

O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu pedido de reconsideração formulado nos autos do Habeas Corpus (HC) 123043 em favor de M.F.R.J. para suspender cautelarmente, até o final do julgamento da presente ação, a eficácia do decreto de prisão preventiva determinado contra o acusado pela 2ª Vara Federal de Araraquara (SP). Com isso, o ministro determinou a expedição do alvará de soltura.
No dia 9 de maio de 2007, M.F.R.J. foi denunciado, com base nos artigos 33 e 35, da Lei 11.343/06, por suposta prática dos crimes de associação para o tráfico e tráfico de drogas.
“Entendo que se justifica o acolhimento do pleito em questão”, ressaltou o ministro Celso de Mello. Para ele, a ausência do acusado a atos relacionados à instrução probatória, como o interrogatório judicial, não legitima, só por si, a decretação da prisão cautelar do réu. Nesse sentido, ele citou como precedente o julgamento do Supremo no HC 95999. O relator observou que nem mesmo a eventual decretação da revelia do acusado autorizaria a utilização da medida excepcional da privação cautelar da liberdade.
Em sua decisão, o ministro Celso de Mello enfatizou que, tratando-se de interrogatório judicial, “o não comparecimento do réu não constitui fundamento suficiente para legitimar a decretação da prisão cautelar do acusado, pois este – como se sabe – sequer está obrigado a responder às perguntas formuladas pelo magistrado (artigo 186, caput, Código de Processo Penal), considerado o direito fundamental, que assiste a qualquer pessoa sob persecução penal, de permanecer em silêncio”. O relator lembrou a jurisprudência da Corte quanto a matéria: HCs 79812, 94016, 94601, 99289, entre outros.
Segundo ele, o acusado buscou justificar os motivos de sua ausência ao interrogatório judicial, “não obstante inafastável a sua prerrogativa fundamental de exercer, sem qualquer consequência negativa, o direito ao silêncio (artigo 186, parágrafo único, CPP)”. Por fim, o ministro registrou que a afirmação de reiteração criminosa “também não se revela bastante, só por si, para justificar a imposição, ao réu, da privação cautelar de sua liberdade individual, eis que, como não se desconhece, tal fundamento tem sido desautorizado pelo magistério jurisprudencial desta Corte Suprema (HC 93790)”.
EC/CR
 

Processos relacionados
HC 123043

fonte: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=273404

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Teori Zavascki nega liminar à defesa de Youssef para acessar autos de inquérito


Por entender que pode haver sigilo de autos quando há risco à investigação, o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, negou pedido apresentado pela defesa do doleiro Alberto Youssef para suspender um inquérito policial. Preso desde março no Paraná na operação lava jato, ele é alvo de investigação sobre suposto uso de telefone celular dentro da carceragem.
A defesa de Youssef questiona no Supremo decisão da 13ª Vara Federal de Curitiba que negou acesso aos autos do inquérito. Para o juiz federal Sergio Fernando Moro, responsável pelo caso, a medida é necessária para não prejudicar diligências em andamento.
A defesa do empresário disse que buscava acesso apenas aos elementos de prova já produzidos e incorporados aos autos. Por isso, tentava uma liminar para suspender o curso da investigação e, no mérito, conseguir acesso ao inquérito. “Não havendo iminente risco de dano irreparável, não é o caso de deferir a liminar requerida”, afirmou Zavascki. Ele solicitou informações do juiz Sergio Moro.
Em maio, o ministro chegou a criticar Moro por ter enviado ao STF apenas parte das provas colhidas na operação lava jato, que poderiam levar à investigação de integrantes do Congresso. Embora a jurisprudência da corte venha desmembrando inquéritos para manter sob sua jurisdição apenas autoridades com prerrogativa de foro, Teori disse que “essa orientação não autoriza que o próprio juiz de primeiro grau se substitua à Suprema Corte”.
No mês seguinte, porém, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal decidiudevolver todas as Ações Penais já abertas sobre o caso ao juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba. Segundo as denúncias do Ministério Público Federal, Youssef controla uma série de empresas com o objetivo de praticar lavagem de dinheiro e evasão de divisas. A defesa nega. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.
Rcl 18.346
fonte: http://www.conjur.com.br/2014-ago-18/zavascki-nega-liminar-defesa-youssef-acesso-autos

NOTA DA REDAÇÃO: O Estado aplicando o direito penal do inimigo.

STJ surpreende em recurso repetitivo e questão bilionária de usineiros vai ao STF

A sistemática dos filtros processuais no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal veio com a promessa de racionalizar os julgamentos. Uma decisão pode dar fim a milhares de processos, economizando o tempo dos julgadores e das partes. Mas a ferramenta também tem seu lado sombrio. Basta uma decisão em recurso repetitivo que inove no ordenamento, em vez de reafirmar jurisprudência pacífica, para provocar um colapso.
É o que promete decisão recente em uma das mais antigas — e custosas — brigas envolvendo a União: a das indenizações às usinas sucroalcooleiras e plantadores de cana por preços que foram congelados abaixo do custo pelo governo federal nas décadas de 1980 e 1990. A disputa é estimada em R$ 107 bilhões pela Advocacia-Geral da União e envolve pelo menos 270 interessados, que multiplicam seus pedidos em milhares de processos e recursos na Justiça.
No fim de 2013, depois de décadas de disputas, o STJ resolveu julgar um recurso repetitivo sobre o tema. Os ministros, confirmando a jurisprudência de até então, reconheceram que o governo deve indenizar as fabricantes de álcool. Mas surpreendeu a todos ao estabelecer um critério que, na prática, esvaziou sua própria decisão: obrigou os usineiros a comprovar prejuízos com o tabelamento. Lançou, assim, sobre os prejudicados o ônus de mostrar algo óbvio: que a União, ao desobedecer a critérios estabelecidos em lei para fixar os valores, cometeu ato ilegal que causou inclusive o fechamento de empresas. No limite, o raciocínio pune empresários que, à época, conseguiram reduzir os prejuízos, e premia quem desistiu de tentar.
Os ministros ainda fixaram a data de 31 de janeiro de 1991 como termo final do direito às indenizações — mais uma vez inovando em um repetitivo. O limite temporal se deu em referência a uma lei que deu atribuições ao Ministério da Fazenda para determinar os preços, agora entendida pelo STJ como uma revogação dos critérios legais anteriores.
Bola nas costas
A decisão do ano passado foi tomada pela 1ª Seção no Recurso Especial 1.347.136, relatado pela ministra Eliana Calmon (foto), por cinco votos a quatro. Até então, havia mais de 40 julgados favoráveis às indenizações no STJ e outros 30 no STF. A mudança repentina de direção ilustra o que já reconhecera um antigo integrante da corte, o ministro Humberto Gomes de Barros, hoje aposentado. Em um voto lendário, ele comparou os julgamentos do STJ às manobras de um piloto de lancha tentando derrubar os passageiros, como em um “banana boat”, mas, no caso, quem cai na água fria são os jurisdicionados  — clique aqui para ler o voto.
Como a mudança de entendimento foi feita logo em recurso repetitivo, os advogados estudam como fazer para convencer as instâncias inferiores a não seguir a decisão do STJ, e sim obedecer ao Supremo. Eles também não sabem como serão tratadas as execuções de decisões já transitadas em julgado, tampouco as ações rescisórias ajuizadas contra julgados alinhados à posição do STF.
A jurisprudência do STJ a respeito se sedimentou durante cerca de dez anos. A primeira decisão foi dada em 2001, contrária aos usineiros. A ministra Nancy Andrighi, relatora do Recurso Especial 79.937, entendeu que a União tem discricionariedade para intervir no domínio econômico sem ter de se submeter a avaliações de seus órgãos técnicos — mesmo que a lei a obrigue a isso.
Em 2005, veio uma das primeiras decisões favoráveis às empresas, que se deveu a posicionamento então recente do STF. Em voto seguido pela maioria dos ministros da 1ª Turma, o ministro Francisco Falcão (foto) rejeitou o Recurso Especial 156.119, ao afirmar que a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, contra a qual a União protestava, se baseava em fatos e provas, o que a Súmula 7 proíbe a corte superior de rejulgar. E que a segunda instância, ao dizer que havia nexo de causalidade entre o dano sofrido pelos usineiros e o ato estatal que o provocou, se ateve ao princípio previsto no artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal: “as pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. Por isso, o foro para a discussão deveria ser o Supremo Tribunal Federal.
As primeiras decisões de mérito do STJ vieram em 2006, relatadas pela ministra Eliana Calmon. Nos Recursos Especiais 703.617 e 675.273, ela foi favorável às empresas, ao mencionar a "responsabilidade objetiva da União" pelos prejuízos — ou seja, independente de comprovação do dano. "Dou provimento ao recurso especial para julgar procedente o pedido de indenização, cujo valor será apurado em
liquidação de sentença, à vista dos elementos constantes da prova pericial", concluiu ela, admitindo que as perícias já feitas pelas usinas eram suficientes para mensurar as indenizações. 
Sete anos depois, em decisão monocrática — dada quando a jurisprudência a respeito é tão firme que não há mais motivos para levar o caso ao colegiado —, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho (foto) fez coro, no REsp 1.305.050. “A jurisprudência desta corte superior de Justiça é pacífica quanto ao cabimento de indenização na hipótese de fixação pela União Federal dos preços dos produtos do setor sucroalcooleiro em níveis insuficientes para cobrir os custos de produção levantados pelo IAA/FGV, ante o disposto nos artigos 1º, 9º, 10 e 11 da Lei 4.870/65”, definiu.
O IAA era o antigo Instituto do Açúcar e do Álcool, que mantinha contrato com a Fundação Getulio Vargas para as medições previstas na Lei 4.870/1965. A lei determinou como os custos do setor deveriam ser calculados em todo o país para a fixação do preço máximo a ser cobrado pela produção. Até hoje, no entanto, a União alega que as medições da FGV foram superestimadas, porque os levantamentos de preços não consideravam apenas os custos para índices mínimos de produtividade, mas também "remuneração de capital próprio e juros reais de financiamento", de acordo com recurso ajuizado no ano passado no STF.
O governo federal também argumenta que calcular o dano simplesmente subtraindo do preço sugerido pela FGV o que foi imposto pelo Estado ignora possíveis implicações econômicas como a redução nas vendas, devido aos aumentos. No entanto, pedido assinado em 25 de janeiro de 2013 pela Procuradoria Regional da União da 1ª Região cita como jurisprudência a favor três decisões das mais altas cortes do país: duas do Supremo e uma do STJ. A mais recente — o Recurso Especial 78.937, primeiro do STJ a respeito — é de 2001. Os demais — Recurso Extraordinário 77.899 e Recurso em Mandado de Segurança 23.543, ambos do STF — foram julgados em 1975 e em 2000, antes, portanto, da posição final da corte, em 2005.
O STF demarcou sua posição a respeito no Recurso Extraordinário 422.941, julgado em 6 de dezembro de 2005. Por maioria, a 2ª Turma acolheu recurso de uma destilaria, seguindo voto do então ministro Carlos Velloso (foto). No entanto, Embargos da União criaram uma situação vista com estranhamento por quem acompanha o caso. Após pedir vista dos autos e trazer voto parcialmente favorável às empresas em 2005, cuja profundidade chegou a ser elogiada por advogados, o ministro Joaquim Barbosa, no dia 22 de maio de 2007, pediu vistas novamente, agora nos Embargos, e o caso não voltou à pauta até hoje, garantindo à União o argumento de que o processo não transitou em julgado. Testemunhas contam que, no dia em que pediu vistas dos Embargos, Barbosa chegou no fim da sessão, depois de dois votos favoráveis à rejeição do incidente processual.
Convicção elástica
Mudanças repentinas de entendimento se tornaram comuns na sequência de acontecimentos. Autora de um voto usado por anos pelos reclamantes, a ministra Eliana Calmon — que, inclusive, ficara vencida ao votar contra a União na primeira decisão do STJ a respeito, em 2001, e que adotava a tese das empresas quando era desembargadora do Tribunal Regional Federal da 1ª Região — foi a relatora do recurso trazido como repetitivo da controvérsia. Entre os dias 20 de fevereiro e 27 de agosto de 2013, a notícia foi comemorada pelas empresas. No dia 28 de agosto, porém, a ministra votou, pela primeira vez, a favor do governo. Foi seguida pelos ministros Arnaldo Esteves Lima, Sérgio Kukina, Napoleão Nunes Maia Filho, Herman Benjamin e Benedito Gonçalves — os dois últimos, com diversas decisões monocráticas acumuladas em favor das usinas. Castro Meira (foto) e Mauro Campbell foram contra. O ministro Ari Pargendler pediu vista.
A sessão do dia 27 de novembro, quando Pargendler trouxe seu voto-vista, foi tumultuada, apontam as notas taquigráficas do dia. De um lado, o ministro tentava mostrar que uma coleção de decisões do STF e do STJ dava estofo à posição dos usineiros. De outro, seus colegas misturavam conceitos de ações de conhecimento e de execução, abrindo uma picada para o Tesouro.
Arnaldo Esteves Lima (foto) chegou a alertar sobre o colapso que a corte estava para causar no Judiciário. “Há uma infinidade de decisões do Supremo Tribunal Federal a respeito da matéria, favoravelmente à tese”, disse ele. “Seria até ilógico que o STJ fixasse no repetitivo uma tese diversa daquilo que o Supremo já consagrou.”
Mas o ministro Herman Benjamin rebateu, dizendo que a tese no repetitivo não era sobre o dever de indenizar, mas sim sobre como arbitrar o que deveria ser pago. Para ele, ao decidir o repetitivo, o STJ teria que definir conhecimento e execução em um só passo. “Nesses processos relativos ao controle no setor sucroalcooleiro, deve-se fazer a liquidação e não simplesmente adotar — de uma maneira genérica, valendo para todos — uma camisa de força, os percentuais, um parecer dado pela Fundação Getulio Vargas”.  
Ari Pargendler insistiu, citando acórdão do STF que afirmou que os prejuízos eram “decorrentes da diferença entre os valores dos preços fixados pelo governo federal e aqueles efetivamente apurados pela FGV e pelo IAA”. Benjamin (foto) se limitou a dizer que o que o STF disse referia-se a um caso específico, a uma única empresa. E Arnaldo Esteves, Napoleão Maia Filho, Mauro Campbell e Ari Pargendler acabaram vencidos quanto ao recebimento do recurso como repetitivo. Ao passarem ao julgamento do mérito, Napoleão pediu vista.
Duas semanas depois, a 1ª Seção voltava à carga. O diálogo reproduzido abaixo, travado entre os ministros Ari Pargendler e Eliana Calmon, revela, nas doses de ironia, a intensidade do embate:
Ari Pargendler: Sr. ministro Napoleão Nunes Mais Filho, penso que o que já se decidiu está decidido. Não deveríamos voltar à discussão. O que foi dito agora já foi antes sustentado pelo ministro Herman Benjamin, de que o Supremo não teria decidido a respeito de qual a fase de cálculo da indenização. Na ocasião, li, então, o voto, nessa parte, do ministro Carlos Velloso no Recurso Extraordinário 422.941, onde S. Exa diz expressamente, e também disse, em voto-vista, o ministro Joaquim Barbosa, que, sim, a indenização deveria corresponder ao custo da cana de açúcar e do açúcar, que não foi observado pelo Executivo e, no caso, era aquele definido pela Fundação Getulio Vargas em convênio com o IAA. Infelizmente, o voto é um pouco longo, mas, na ocasião, eu li e dizia exatamente que a diferença era essa: a fixação de preços a serem praticados pela recorrente por parte do Estado em valores abaixo da realidade e em desconformidade com a legislação aplicável... Quem se der ao trabalho de ler esse acórdão, e peço ao sr. ministro Napoleão Nunes Maia Filho que o leia para que retifique depois o seu ponto de vista, porque esse assunto foi, sim, decidido pelo Supremo Tribunal Federal.
Eliana Calmon: O Supremo já disse. Então, estamos perdendo tempo.
Ari Pargendler: Isso foi o que eu disse.
Eliana Calmon: Se eu tivesse visto isso... Nunca vi isso, mas, se eu tivesse visto, não tinha escrito.
Ari Pargendler: Faltou ler o acórdão. Se tivesse lido ou escutado a parte que eu li na sessão anterior... Por isso, acho que é completamente... 
Eliana Calmon (interrompendo): Pois é, era isso que eu tinha que fazer. Por que eu escrevi tantas páginas sem necessidade alguma, não é? E o Supremo Tribunal Federal já tinha dito... E durante quase oito anos, aqui, todo mundo discutindo, uns contra, outros a favor... Ninguém leu esse acórdão!
Ari Pargendler: Todos leram. Está aqui. Citei o número dele: 422.941. Então, peço ao ministro Napoleão Nunes Maia Filho, que sei que sempre reconsidera os erros que comete, que reconsidere esse também.
Após o debate, a Seção colocou uma pedra no assunto. A maioria seguiu a ministra Eliana Calmon, negando o Recurso Especial e ignorando os apelos de Ari Pargendler, Castro Meira, Mauro Campbell e Napoleão Maia Filho, que retificou seu voto. 
O voto-vista de Napoleão resume a diferença lógica entre uma coisa e outra. “O si debeatur está definido e o quantum debeatur deverá observar a metodologia posta na sentença”, cravou. 
Repetitivo curinga
A escolha do recurso que representaria a controvérsia também foi nebulosa. Os três acórdãos escolhidos como paradigmas foram todos mandados em 2012 pelo desembargador Daniel Paes Ribeiro, então vice-presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região — de onde vêm cerca de 90% dos recursos sobre o assunto. Todos tinham Ribeiro como relator, o que não é exatamente uma boa amostragem de divergência sobre o assunto. Diva Malerbi, desembargadora convocada para o STJ, foi quem pinçou os acórdãos como representativos da controvérsia.
Na 1ª Seção, a escolha foi questionada pelos ministros, assim como a abrangência do que foi demarcado como "questão repetitiva". Diva avisara aos tribunais para sobrestar o que se referisse ao direito dos usineiros à indenização, nos limites dos acórdãos recebidos do TRF-1. Mas a discussão travada no STJ se estendeu para o critério de apuração dos danos e o limite temporal do direito às indenizações.
Ao pedir vista do processo, Pargendler (foto) alertou a corte, concordando com as observações do colega Castro Meira:
"Na técnica do julgamento do Recurso Especial, precisamos que o tema tenha sido prequestionado e que o Recurso Especial enfrente o tema. Na técnica do recurso repetitivo isso não se altera. Julga-se primeiro o caso para, em função do caso, extrair aquela norma que vai orientar a solução dos casos futuros. Dito isso, passo a ler o que o tribunal [TRF-1] decidiu: 'Sr. Presidente, efetivamente para o melhor esclarecimento apelação acrescentando que protesto pela juntada de voto escrito a respeito'. O voto não diz respeito ao processo. Então, para mim, esse acórdão é nulo porque está dizendo que tem uma opinião que ele não manifestou. Como vamos julgar isso em recurso repetitivo?"
Ao trazer voto-vista três meses depois, o ministro confirmou o que suspeitara. "O tema decidendo submetido ao regime do artigo 543-C do Código de Processo Civil, tem como matéria-prima o voto condutor do acórdão recorrido de escassas dezoito linhas — dezoito linhas no formato que estamos lendo. Treze linhas no formato do voto condutor do acórdão recorrido", admirou-se. "O voto da relatora [Eliana Calmon] inverteu essa equação [aplicar o direito ao caso concreto e só depois extrair a orientação para os casos idênticos] traçando inicialmente o que chamou de conclusões, para num segundo momento adequá-las à espécie."
Pargendler voltou a criticar tropeços de Eliana quanto ao manejo do rito dos repetitivos. "O juiz está limitado pela técnica processual que o impede, por exemplo, de julgar o mérito, quando pronunciar a prescrição. Limitação análoga resulta do voto da relatora no tópico em que proclamou que o regime de administração de preço do açúcar e do álcool foi revogado pela Lei 8.178, de 4 de março de 1991. Se essa revogação ocorreu (...), não há o que discutir após esse período. A improcedência do pedido sobre essa ótica resulta desse só fato, de modo que a orientação preconizada para os recursos idênticos só teria suporte neste ponto. É que, como nós só estamos discutindo diferenças a partir de 1994, se a lei está revogada desde 1991, não temos nada mais para discutir." Arnaldo Esteves Lima foi o único a mudar seu voto ao ouvir o colega. Ele se juntou à minoria de três ministros.
Tese encolhida
Essa última advertência de Pargendler tem a ver com um agravante. Além de inviabilizar a responsabilização objetiva da União pelos danos que ela própria causou ao não seguir critérios definidos em lei, o STJ ainda restringiu o período em que o governo federal deve indenizar. O entendimento se baseia no seguinte raciocínio: a Lei 4.870/1965 foi quem colocou a precificação sob administração do Estado. Leis posteriores endureceram de vez o congelamento, proibindo qualquer reajuste sem aprovação prévia do Ministério da Fazenda. A última delas foi a Lei 8.178/1991. Além disso, em 1990, o Instituto do Açúcar e do Álcool, órgão responsável pela avaliação de custos médios, foi extinto.
Para a União, a discricionariedade do ministro da Fazenda para arbitrar preços e o fim do IAA provam que os critérios legais previstos antes foram extintos. Já as empresas afirmam que nenhuma das normas posteriores revogou expressamente a Lei 4.870. E que só um despacho de 1996 liberou definitivamente os preços: a Portaria 294, de 13 de dezembro, que agendou para 1º de maio de 1998 a volta dos preços de mercado.
A discussão gerou quatro teses com datas distintas para o fim do direito às indenizações. Para a ministra Eliana Calmon, “o advento da Lei 8.178/1991 efetivamente significou ruptura à antiga sistemática de preços regulada pelo IAA, consoante determinado pela Lei 4.870/1965, ou seja, até 4 de março de 1991”. E foi também aí seguida pela maioria.
Última palavra
Agora, a saída pode ser, novamente, o Supremo Tribunal Federal. Dadas as súmulas 7 e 279, a corte jamais reconheceria a repercussão geral de um Recurso Extraordinário tratando de caso com pelo menos 30 julgados no mesmo sentido. Mas o nó criado no STJ pode abrir a possibilidade. “Vamos alegar violações que decorreram do trato da matéria no repetitivo, como a alteração da jurisprudência do STJ e a ignorância quanto às decisões do STF, o que viola a segurança jurídica e a isonomia”, diz a advogada Anna Paola Zonari (foto), do escritório Dias de Souza Advogados. A banca foi quem levou o tema aos tribunais, décadas atrás. “A responsabilidade do Estado está prevista no artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal, em caso de dano causado a particular a ser indenizado”, completa a tributarista.
Ela afirma ainda haver inconsistência entre o que foi reconhecido como ato danoso — a fixação dos preços abaixo do custo e das bases fixadas pelas entidades delegadas — e o que foi reconhecido como dano. “O STJ reconheceu como ilegal o ato estatal, mas, ao exigir a comprovação contábil do prejuízo, disse que o dano não decorre do ato. Ou seja, o dano depende da gestão da empresa”, resume. "Acontece que não há nexo de causalidade entre o a fixação arbitrária de preços e o eventual prejuízo contábil da empresa".
Segundo Anna Paola, a justificativa será usada, inclusive, para tentar convencer as demais instâncias a não aplicar o julgado do STJ. “Há um conflito institucional. Os desembargadores devem aplicar o entendimento do STJ ou do STF? Há uma disparidade de soluções para a mesma questão jurídica, que tem base constitucional”, explica. E arremata: “O STJ violou, inclusive, sua própria competência constitucional, ao criar confusão em vez de uniformizar a jurisprudência”.
Lourenço Paiva Gabina (foto), advogado da União que acompanha cada passo do caso há seis anos, discorda. "As empresas é que alegam contradição, mas os precedentes do Supremo foram respeitados. Perdemos quanto ao dever de indenizar, embora ainda recorramos no Supremo, mas sobre o valor devido, o Supremo nunca decidiu."
Ao rebater os Embargos de Declaração das empresas ajuizados no STJ, a AGU relaciona 10 julgados do Supremo para mostrar que a corte ainda não tem posição firme sequer sobre o recebimento desses recursos. Mesmo após o julgamento do RE paradigma para as empresas, a corte negou, pelo menos cinco vezes, o conhecimento de recursos sobre o tema por se tratarem de "matéria fática" ou de "exame de norma infraconstitucional". "Os julgados do STF, portanto, devido à incoerência, não são capazes de fixar uma diretriz segura", diz a União.
A peça diz ainda que o único acórdão em que o Supremo fala sobre o critério de cálculo é no RE 422.941, e que o único voto a mencionar essa ideia foi Joaquim Barbosa. "O ministro Joaquim Barbosa, no voto-vista, afirma que, naquele caso, a perícia analisou a situação concreta da empresa." Isso comprova, para a União, que o STF ainda não tem entendimento pacificado a respeito.
Gabina admite que a escolha dos acórdãos como representativos da controvérsia para se julgar o repetitivo no STJ não foram "assim tão aptos". Mas explica: "A lei é muito vaga e o STJ ainda está construindo uma jurisprudência a esse respeito. Há diversas decisões diferentes sobre questões que devem constar no repetitivo e essa é apenas uma delas". E diz que as empresas poderiam ter argumentado isso no início do julgamento, mas não o fizeram, porque esperavam ganhar o recurso.
"Apenas quando percebeu que poderia ter seu recurso desprovido, [a empresa recorrente] passou a suscitar a alegada nulidade do julgamento. Trata-se, portanto, de atuação que desrespeita a integridade da corte julgadora, bem como a lealdade com a parte adversa, no caso, a União", relata o advogado.
Revogação subliminar
Limitar as indenizações aos prejuízos das empresas entre 1965 e 1991 é outra decisão do STJ que será levada ao STF pelas empresas. O argumento a ser usado é que o artigo 174 da Constituição, que autoriza a intervenção do Estado na economia, prevê que isso seja feito “na forma da lei”, e não sem critérios objetivos — a União defende que as normas que aumentaram o poder de decisão do ministro da Fazenda aboliram os critérios. 
O Supremo chegou a tangenciar esse assunto em 2000. "Claro está que o artigo 10 da antiga Lei 4.860/65 não foi revogado pela portaria impugnada, mas pela Lei 8.178/91, na medida em que deixou a critério do então ministro da Economia, Fazenda e Planejamento a liberação dos preços de qualquer setor, fato que acabou concretizado, pela referida autoridade, por meio dos atos mencionados", disse o então ministro Ilmar Galvão (foto), relator do Recurso em Mandado de Segurança 23.543, julgado pela 1ª Turma. A afirmação, no entanto, não fez parte do mérito da decisão, mas sim do chamado "obiter dictum" — uma argumentação sem poder dispositivo.
A própria União, em parecer, entendeu que a Portaria 102/1998, a que se referiu o ministro Ilmar Galvão, ao liberar os preços, não revogou a Lei 4.870/1965. "A citada Portaria, autorizada pela Lei 8.178, de 1991, como não poderia deixar de ser, trata apenas e tão-somente da liberação de preços, não tendo o condão, portanto, de promover a revogação da Lei 4.870, de 1965, o que somente poderia ocorrer com o advento de uma nova lei", diz o Parecer 1.941/01, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Mas, hoje, a União justifica o parecer dizendo que se trata de uma derrogação de um artigo específico da antiga lei.
Outra reclamação que deve chegar à corte suprema é o cálculo das indenizações. Com decisões favoráveis em ações de conhecimento, bastaria, de acordo com as regras processuais, dar liquidez aos títulos judiciais. Segundo Anna Paola, todas as 80 ações ajuizadas pelo escritório foram acompanhadas de perícias demonstrando a diferença entre o preço estipulado pelo IAA e o determinado pelo Estado. Nesse caso, seria suficiente uma execução por cálculo para atualizar o valor da perícia até hoje. “Mas a União sempre defendeu que é preciso outro laudo pericial na execução para que se comprove o prejuízo contábil do exequente”, diz. “Há coisa julgada e a execução não pode mudá-la. Mas o STJ disse que todas as execuções desses casos terão de ter nova perícia. Vencemos parcialmente Embargos de Declaração a respeito no repetitivo, mas a União pode entrar com Embargos às Execuções nos demais tribunais.”
Um último temor são as Ações Rescisórias. Segundo Anna Paola Zonari, existe a possibilidade de a União usar a nova interpretação do STJ para alegar que decisões de instâncias inferiores em favor de empresas — proferidas antes do julgamento do repetitivo — violaram literalmente dispositivo de lei. “Não existe hipótese de rescisória devido à mudança de jurisprudência, e a União até hoje não ganhou sequer uma rescisória nos nossos casos, mas há rescisórias sobrestadas nos tribunais regionais federais aguardando a decisão do repetitivo”, alerta. 
No último mês de junho, ao julgar Embargos de Declaração de ambos os lados contra a decisão, o STJ confundiu mais do que esclareceu ao dizer que, "nos casos em que há sentença transitada em julgado, no processo de conhecimento, a forma de apuração do valor devido deve observar o respectivo título executivo", o que dá a entender que o que vale é o cálculo previsto na decisão transitada. Mas guinou em seguida ao concluir: "nos casos em que a ação de conhecimento for julgada procedente, o quantum da indenização pode ser discutido em liquidação de sentença por arbitramento, se, de outro modo, não dispuser o título executivo, em conformidade com o artigo 475-C do CPC, podendo, inclusive, chegar a dano em valor zero", permitindo a interpretação de que o juiz pode arbitrar a quantia devida como quiser.
Segundo o advogado da União Lourenço Paiva Gabina, a AGU ainda estuda se vai entrar com ações rescisórias tendo como fundamento a última posição do STJ. No entanto, ele lembra que o ministro Mauro Campbell Marques já concedeu tutela antecipada à União em uma essas ações, interposta antes da definição do repetitivo. A decisão foi dada na Ação Rescisória 5.241.
Histórico
Foi durante a ditadura militar, em 1965, que o governo federal determinou os critérios da intervenção direta do Estado sobre os preços do setor sucroalcooleiro. O artigo 10 da Lei 4.870/1965 determinou que o preço oficial dos produtos do ramo seriam fixados “(...) tendo-se em vista a apuração dos custos de produção referidos no artigo anterior”. Ou seja, os custos de produção seriam apurados tecnicamente pelo próprio governo. Os critérios técnicos vinham no artigo anterior, que delegava ao então Instituto do Açúcar e do Álcool (I.A.A.) — extinto em 1990 — a função de, contabilmente, apurar os custos estaduais e as médias regionais e nacional.
O instituto, por sua vez, contratava a Fundação Getulio Vargas para fazer as apurações. A fundação prestou esses serviços até o fim da intervenção, em 1998. Esses dados eram passados ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, com proposta de preços. No entanto, o Ministério da Fazenda, sempre por razões de política econômica, recusava sistematicamente os preços propostos, alegando que pressionariam a inflação. O setor passou a enfrentar dificuldades financeiras e ver quebradeiras.
Em 1989, o governo federal reconheceu ter praticado preços defasados e firmou um “Acordo de Pontos Básicos para Condução da Política de Preços do setor sucroalcooleiro”. Esse acordo, assinado pelo ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega (foto), previa a fixação dos preços com base nos custos médios ponderados setoriais. Mas foi cumprido pelo governo por apenas três meses. Em janeiro de 1990, com a nova gestão Fernando Collor de Mello na Presidência da República, os preços voltaram a ser represados, o que provocou uma corrida por indenizações na Justiça. Só em 1998, com a Portaria 275 do Ministério da Fazenda, os preços foram liberados.
Hoje, a estimativa do débito tem avaliações bem distantes. Empresas do setor calculam que as indenizações devidas beiram os R$ 20 bilhões. Estudo recente da AGU, no entanto, prevê R$ 107 bilhões. Na Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2014, o provisionamento de custos com uma possível derrota na Justiça, feita pelo Ministério do Planejamento, é de R$ 50 bilhões.
"O valor provisionado na lei é vago e muito antigo, cogitado desde que eu comecei a trabalhar com esse assunto", diz o advogado da União Lourenço Gabina. "Já o estudo feito em junho de 2013 pela AGU é mais recente e minucioso, com base em cada um dos processos."
Veja lista de julgados do STF a favor da indenização:
ProcessoRelatorPublicação
RE 583.992Ellen Gracie01/04/2009
RE 588.471Ellen Gracie21/05/2009
AI 758.912Ellen Gracie18/11/2009
AI 683.098Ellen Gracie30/03/2010
AI 752.432Cármen Lúcia22/04/2010
RE 598.537Dias Toffoli26/05/2010
AI 769.031Dias Toffoli15/12/2010
AI 813.180Gilmar Mendes01/02/2011
AI 832.292Gilmar Mendes21/02/2011
AR 2.264Cármen Lúcia02/03/2011
RE 545.068Dias Toffoli31/03/2011
RE 593.909Dias Toffoli13/04/2011
AI 753.872Dias Toffoli13/04/2011
AI 785.110Gilmar Mendes18/05/2011
ARE 644.726Gilmar Mendes01/08/2011
ARE 653.951Gilmar Mendes30/09/2011
RE 634.438Luiz Fux24/02/2012
RE 632.644Luiz Fux27/02/2012
AI 777.361Dias Toffoli30/03/2012
RE 648.622Luiz Fux11/05/2012
AI 754.769Cármen Lúcia15/05/2012
AI 854.694Luiz Fux26/06/2012
MC na AR 2.363Dias Toffoli15/05/2013
MC na AR 2.339Roberto Barroso26/08/2013
ARE 648.682Rosa Weber11/04/2014
RE 696.298Roberto Barroso08/05/2014
AI 754.714Roberto Barroso09/05/2014
  
Veja lista de julgados do STJ a favor da indenização:
ProcessoRelatorPublicação
REsp 156.119Francisco Falcão30/09/2004
REsp 703.617Eliana Calmon02/08/2006
REsp 675.273Eliana Calmon02/08/2006
REsp 845.424Denise Arruda07/11/2006
REsp 744.077Luiz Fux09/11/2006
REsp 735.032Francisco Falcão01/03/2007
REsp 891.231Denise Arruda07/05/2007
REsp 880.267Denise Arruda10/05/2007
REsp 783.192Denise Arruda03/12/2007
AG 1.028.875Teori Zavascki09/06/2008
REsp 926.140Luiz Fux15/10/2008
REsp 753.163Castro Meira13/11/2008
REsp 1.095.285Francisco Falcão25/11/2008
REsp 771.787João Otávio de Noronha27/11/2008
RESP 1.035.901Herman Benjamin12/12/2008
REsp 1.023.262Herman Benjamin12/12/2008
REsp 1.057.158Castro Meira24/03/2009
REsp 1.107.212Herman Benjamin15/05/2009
REsp 1.117.278Humberto Martins23/06/2009
REsp 1.135.632Herman Benjamin29/09/2009
REsp 1.126.024Castro Meira20/10/2009
AG 1.248.107Mauro Campbell16/12/2009
AG 1.207.618Mauro Campbell20/04/2010
REsp 1.151.634Herman Benjamin23/04/2010
AG 1.292.482Herman Benjamin29/04/2010
REsp 110.005Benedito Gonçalves05/10/2010
REsp 1.110.005Benedito Gonçalves05/10/2010
REsp 1.182.896Castro Meira25/03/2011
REsp 1.186.685Humberto Martins24/05/2011
AG 1.158.669Mauro Campbell03/06/2011
REsp 1.066.831Humberto Martins23/11/2011
AREsp 70.082Francisco Falcão14/02/2012
AG 1.429.025Benedito Gonçalves14/03/2012
AREsp 119.009Mauro Campbell11/04/2012
AREsp 147.188César Asfor31/05/2012
AREsp 187.094Mauro Campbell03/09/2012
AREsp 20.930Napoleão Nunes Maia Filho17/09/2012
AREsp 137.149Napoleão Nunes Maia Filho26/11/2012
REsp 1.305.050Napoleão Nunes Maia Filho07/05/2013

Clique aqui para ler o acórdão no REsp 1.347.136.
Clique aqui para ler a decisão do STJ que reconheceu o recurso como repetitivo. 
Clique aqui para ler o acórdão do TRF-1 paradigma para recurso repetitivo.
Clique aqui para ler acórdão do STF no RE 422.941.
Clique aqui para ler as contrarrazões da União nos Embargos de Declaração das usinas contra o REsp 1.347.136.
Clique aqui para ler o acórdão no REsp 703.617, relatado pela ministra Eliana Calmon.
Clique aqui para ler o acórdão no REsp 675.273, relatado pela ministra Eliana Calmon.
Clique aqui para ler a decisão no Recurso Especial 79.937, relatado pela ministra Nancy Andrighi.
Clique aqui para ler a decisão monocrática do ministro Napoleão Nunes Maia Filho no REsp 1.305.050.
Clique aqui para ler Recurso Extraordinário da União no STF.

fonte: http://www.conjur.com.br/2014-ago-18/stj-inova-recurso-repetitivo-questao-bilionaria-ruma-stf